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Foto do escritorThainá Christine

A maternidade não romantizada na literatura atual

Thainá Christine é professora, revisora e escritora. Escreve histórias de terror com protagonismo feminino e é apaixonada pelos clássicos do gênero.











Na semana passada, analisei o conto Uma Galinha, da Clarice Lispector, que tem uma visão idealizada da maternidade durante o século XX. Antes, quando a mulher engravidava, havia um certo endeusamento perante a mulher e a nova vida que ela estava gerando. A partir dali sua vida deveria ser apenas em prol da criança, pois a mulher-mãe não era mais mulher, tornava-se, então, apenas mãe.


Hoje há diversas obras que abordam o outro lado da maternidade com uma forma não romantizada, mostrando as dificuldades sociais e emocionais de ser mãe. Afinal, há muito ganho, mas também muita perda.


Por isso, separei 5 obras escritas por mulheres que narram um novo lado da maternidade, sem embelezamento, sem mentiras lavadas. Obras essas que trazem palavras verdadeiras, mas que, exatamente por isso, também podem chocar.


O Peso do Pássaro Morto, escrito pela brasileira Aline Bei, traz uma narrativa forte ao ter uma narradora-protagonista que divide conosco pedaços importantes de sua vida. Passamos pela sua infância e pela sua adolescência, para logo depois chegarmos a fase adulta onde ela é mãe. Porém, há um problema: para ela, a maternidade nunca foi flores. Ela nunca se conectou com o filho, nunca conseguiu ser aquela mãe carinhosa e amorosa como a sociedade insiste em retratar. É doloroso observar a falta de afeto familiar e a vida solitária que envolvem a protagonista, mas, ao mesmo tempo, também é necessário termos contato com narrativas que nos mostram um outro lado da maternidade, mesmo que mais obscuro e devastador. Já foi confirmado uma adaptação para O Peso do Pássaro Morto, só nos basta esperar.


A filha primitiva, da cearense Vanessa Passos, conta a história de três gerações de mulheres não nomeadas. A mãe, a filha e a neta. Todas sem nome, sem identidade. Vivem um ciclo que também ultrapassa as gerações: o abandono, a punição, as mesmas dores. Aqui, a maternidade é violenta, sangrenta e dolorida, com cenas fortes de violência que moldam a trajetória particular e coletiva dessas mulheres. A escrita da Vanessa dói, é amarga, mas também é direta e bonita. Um dos livros que mais me marcou, pois há um pouco de nós na mãe, na filha e na neta, e isso é o que mais machuca – a percepção de que todas somos iguais em certas dores e traumas.


Hibisco Roxo, da autora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, é um livro sobre fanatismo e intolerância religiosa, violência doméstica e colonização. Há a dualidade entre a maternidade escolhida pela mãe e pela tia da protagonista Kambili. Duas mulheres com vivências diferentes, vozes diferentes e futuros diferentes. A criação de seus filhos se diverge, mas encontra um caminho para se cruzarem e se entrelaçarem. De um lado, adolescentes criados a base de religião, submissão e patriarcado. Do outro, uma mãe viúva que dá ensinamentos com base no amor e na liberdade. Esse foi o primeiro romance que li da Chimamanda, mas que me fez, automaticamente, desejar por mais.


Precisamos Falar Sobre o Kevin, da autora Lionel Shriver, retrata a relação entre mãe e filho e todas as consequências de um adolescente sociopata. Eva nunca quis ser mãe e, mesmo quando já estava grávida de Kevin, não conseguiu desejar e amar o seu primeiro filho. A relação entre os dois sempre foi fria, com trocas de farpas e desconfiança, mas piorou quando Kevin fez um atentado em sua escola. Será que a sociopatia de Kevin é resultado dessa falta de amor materno? E será que Eva realmente não nasceu para ser mãe ou o problema foi engravidar por obrigação? Essas são apenas algumas questões que se passam pela cabeça de Eva, pois a história consegue se aprofundar ainda mais na maternidade, nas relações familiares e no psicológico dos personagens. O livro já conta com uma adaptação para o cinema que é tão boa quanto o livro, por isso recomendo os dois.


O Impulso, da autora Ashley Audrain, irá debater sobre a obrigatoriedade da maternidade mesclando-a com a crueldade humana. A protagonista Blythe tem medo de repetir os erros da mãe e, por isso, não conseguir criar um laço com a filha recém-nascida, sendo isso exatamente o que acontece. Mas, além da falta de amor e conexão com a filha, Blythe também percebe que a criança pode ter algo, como um instinto maligno e repulsivo. Enquanto Precisamos Falar Sobre o Kevin tem como base o drama, O Impulso trará um ritmo frenético de thriller que nos deixará apreensivos e sem fôlego.


Vou deixar dois títulos como recomendações honrosas, já que a maternidade não é o foco nessas obras, mas ainda é um detalhe importante para a narrativa.


O suspense Confissões, da japonesa Kanae Minato, é uma história de vingança. A professora Yuko Moriguchi perdeu sua filha de cinco anos que morreu afogada na piscina da escola em que Yuko dá aulas. Tudo indica que a morte não foi um acidente, mas, sim, um assassinato causado por dois de seus alunos. Há a vontade de punir, a dor dilacerante, o luto que não passa. É uma leitura lenta, mas sufocante. A psicopatia infantil assusta e dá medo, mas as consequências do sofrimento materno também. A obra tem uma adaptação cinematográfica boa, mas não consegue chegar ao ápice da narrativa na literatura.


O romance policial Quando os mortos falam, da autora Claudia Lemes, trata de assuntos pesados, como o luto, o sentimento de incompetência, ataques de pânico e isolamento. A protagonista Verena é uma ex investigadora que abandonou o cargo após o assassinato de sua filha mais nova não ser solucionado. Com isso, a autora explora os traumas, os medos e – posteriormente – a coragem da personagem, sempre colocando a maternidade como algo intrínseco dela, como uma parte de si.


Diante dessas recomendações, posso confessar que cinco delas estão entre os meus favoritos da vida, sendo assim recomendações mais do que importantes. Por mais que eu não seja mãe, admito que o tema da maternidade, principalmente quando não romantizado, é algo que me interessa e gera curiosidade.


Portanto, deixo aqui esses títulos para que vocês possam procura-los, aprecia-los e, depois, comenta-los comigo. Será um prazer dividir opiniões e impressões sobre um assunto tão crucial na nossa atualidade.

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