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Foto do escritorMatheus Maciel

A pesada coroa de "Arcane"

Matheus Maciel











Arcane“ retornou em sua segunda temporada neste mês. (Imagem/Reprodução: Netflix)

Se você gosta de ficção de fantasia, é gamer ou apenas está atento ou atenta às novidades cinematográficas do mundo dos seriados, deve ser muito difícil ignorar Arcane (2021 - ) nas redes sociais nos últimos dias.


Imagino que o resultado da obra, enquanto produto industrial, deve ter sido dos mais agradáveis para os produtores e investidores, pois a série conseguiu transformar em identidade visual o Santo Graal publicitário que carrega certo estigma: o “chamar atenção”.


Arcane, o título em si já me remete direto a barulho de explosão e tons vibrantes de azul e rosa, talvez um grito a todo pulmão que combine com a música promocional da segunda temporada, Heavy is The Crown, da banda estadunidense Linkin Park; e aliás, é homônima ao título do primeiro episódio da segunda temporada. A tal coroa, de fato, carrega um peso simbólico consistente. O triunfo da obra, creio eu, é jogar com a gravidade de onde esse peso está situado.


Em outras palavras: quem carrega a coroa mais pesada?


Até o momento em que estou redigindo esta coluna, só assisti aos primeiros três episódios da segunda - e última - temporada, que está dividida em três atos de três episódios cada. Ainda assim, o que mais me motiva a selecionar um tema para escrever aqui não é sobre a trajetória pronta, mas sim as perguntas que borbulham e ficam no ar. Particularmente, não sou o maior fã dessa retomada da “serialização” dos episódios; receber uma temporada inteira me deixa mais empolgante. Enfim, perdão pelo divagar. 


A coroa de que falei é a dinâmica que se conecta ao que pode ter sido a encomenda da série. Arcane, como um derivado do tão popular jogo League of Legends, têm a missão de representar o máximo possível dos seus personagens em tela. Estes personagens é que dividem a tal coroa. Pode parecer a receita para uma narrativa com tendência ao confuso e monótono em determinados núcleos, mas raramente acontece aqui, pois o ritmo não permite. O ritmo da narrativa e edição é a chave do sucesso. 


Eu explico.


O enredo é focado em mostrar as contradições de um espaço urbano, ou melhor, dois. Piltover, a metrópole cosmopolita, colorida e cheia de vida, faz constante a um “não-espaço” urbano apresentado como “subferia”, mas que tem o nome de Zaun. A série aposta na inflamação entre as contradições de viver nesse espaço que nos é tão familiar em estrutura. Os personagens, avatares dessas contradições, levam orgulhosos ou negam as questões que lhes cabem dadas as condições sociais a que estão inseridos. E o melhor de tudo: nada é estático, tudo depende da trama, o que pode te fazer grudar o rosto na tela de apreensão ou interesse. 


O conceito de magia em Arcane também é único e bastante interessante. Na ficção de fantasia, a ideia de uma potência como “magia” ou “arcanismo” é uma espécie de cola que une as obras ao gênero.


Bem, isso pode ser um problema.


O muito difundido conceito de worldbuilding, que permeia canais de YouTube, Podcasts, artigos e tanta outras mídias informativas, é um carro-chefe quando se trata da elaboração de fantasia; quase como se a identidade da história estivesse algemada à identidade do conjunto de regras e conceitos do mundo em que está ambientado. Não me entenda mal, dar forma ao ambiente é fundamental ao gênero, mas parece que o valor de uma história de fantasia consiste, primariamente, no valor do “parque de diversões” em que o mundo foi montado.


 Vindo de uma marca tão poderosa e com uma base de fãs fiel e exigente como a de League of Legends (isso para não falar no medo histórico de adaptações cinematográficas de videogames), Arcane se saiu muito bem em apresentar seu ambiente, sem floreios, tampouco sem faltar potência. Nós começamos nos acostumando com as personagens Violet e Powder - a futura Jinx - e suas questões sociais, pessoais, econômicas e, de quebra, passeamos por uma cidade de tirar o fôlego. As dinâmicas estão todas na tela, e não foi cansativo montar o quebra-cabeças de como as coisas funcionam por ali.


Fica estabelecido, portanto, que as questões vão sempre confluir, nada precisa ser mostrado “à força” ou de forma burocrática para que o personagem e seus conflitos tenham sentido.


A magia segue a dança. O mundo apresenta um misterioso tabu em relação à feiticeiros e forças místicas, vistas como perigosas, mas muito úteis. Basta um empurrãozinho para uma revolução industrial que extraia o melhor do pouco que se sabe; dado com louvor pelos personagens Viktor e Jayce. 


Isso pode incorrer no termo que me é tão incômodo, a Tecnomagia, que cerca o suposto conceito de um mundo de tecnologias “avançadas” desenvolvidas de forma mística. Terminologia equivocada, visto que qualquer uso replicável conscientemente e sob método de, por exemplo, algum feitiço, não é visto da mesma forma. Entendo que o apelo seja majoritariamente estético, evocando imagens como fábricas movidas por cristais arcanos ou armas sencientes, mas é uma ideia que se prova inconsistente e carente de referencial.


Porém, por favor, guardem as tochas e forcados, pois Arcane combina tal estética com conceitos nem pedantes nem insuficientes de como a chamada “Hextech” opera. Seus mistérios não me parecem conveniências sombrias, mas de fato, mistérios, que incomodam os personagens e movem a trama.


Isso é o que eu posso dizer até o primeiro ato de Arcane. Vou ficar de olho nos próximos capítulos para ver se as promessas se concretizam.

Até lá, vou tentar a resistir a tentação de instalar o “lolzinho” e sofrer de estresse.


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1 Comment


Para alguém que não curte muitos animes, Arcane tem se mostrado uma obra de arte!


Matheus, muito perspicaz a abordagem do parque de diversões, do busca do cenário em detrimento do desenvolvimento dos personagens.


E, lógico, a singular forma com que trata a relação risco-retorno de lidar com a magia a partir da tecnologia, com uma denominação criativa, hextech.


Já assisti os novos três episódios, aguardando os três últimos na expectativa de deleites - visual, narrativo,contextual.

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