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Foto do escritorGabriel Mello

Ucronia: afinal, o que é esse gênero do "e se"?

Gabriel Mello, colunista da Revista Especular









Recentemente a Revista Especular nos apresentou sua nova identidade visual: uma estrela de seis pontas irregulares em que cada ponta representa um gênero dentro da ficção especulativa. A surpresa para o publico geral, no entanto, se deu pelo apontamento da ucronia como um destes eixos presentes na Especular.


Você pode ver melhor a nova logo e seu significado na publicação feita no Instagram oficial aqui


Também conhecida como História Alternativa, a ucronia é um subgênero bastante presente na produção especulativa dentro da literatura. Mas, diferentemente do terror ou da própria ficção científica, a ucronia parece ser um subgênero especulativo quase que puramente relacionado à literatura e à história.


Ganhou principalmente o público com o seu "e se?" - como gosto de falar -, que anda não só para frente, mas também para trás. Isso porque a ucronia, diferentemente do sci-fi mais puro, não se limita às especulações do futuro; na verdade, o charme da História Alternativa é pensar em possibilidades do próprio passado. Ainda assim, queria ressaltar que o gênero também não se restringe ao que poderia ter sido, podendo se manifestar no que pode ser, quando passa a vestir nomenclaturas mais comuns, como a da "utopia" e a da "distopia".


Desde os anos 1950, esse subgênero de ficção tem se mesclado amplamente com os elementos da ficção científica, incluindo a fusão de diferentes períodos históricos; realidades paralelas; viagens entre histórias/universos alternativos; ou rotineiras viagens para cima e para baixo no tempo, o que resulta na divisão da história em duas ou mais linhas temporais.


"O Homem do Castelo Alto", de Philp K. Dick, publicado em 1961

O divertido da ucronia está justamente em perceber essa interseção de épocas, ou uma divisão temporal e os temas de histórias alternativas que se entrelaçaram de tal maneira que é impossível discuti-los separadamente. O exemplo mais clássico é O Homem do Castelo Alto (1961) de Philip K. Dick, no qual os nazistas saem vitoriosos na Segunda Guerra Mundial e leitor tem que se acostumar àquilo que se torna uma verdadeira realidade paralela.


A primeira obra de história alternativa, no entanto, parece ter sido o romance de Louis Napoléon Geoffroy-Château (1803-1858), onde o autor imagina que Napoleão conquistou Moscou antes do inverno de 1812, possibilitando-lhe dominar grande parte do mundo. Já na literatura inglesa, a primeira história alternativa conhecida é o romance de Nathaniel Hawthorne, P.s Correspondance (1845), que retrata um homem aparentemente louco percebendo uma realidade onde figuras políticas e literárias já falecidas ainda estão vivas.



Já no Brasil o primeiro exemplo é de José J. Veiga (1915-1999), com A Casca da Serpente (1989), que imagina Antonio Conselheiro (1830-1897) como um sobrevivente ao Massacre de Canudos (1897), fundando uma nova Canudos, que existiu ao longo do século XX até a sua verdadeira destruição apenas durante o regime militar na década de 1960. E a criatividade dentro do gênero não para: em uma novela lançada em 1993, Gerson Lodi-Ribeiro imagina um presente alternativo em que o Brasil é um país muito menor devido à sua derrota na Guerra do Paraguai (1864-1870); já em 2010 Roberto de Sousa Causo imagina uma linha temporal alternativa em que o Brasil teria tentado invadir militarmente as Guianas, no início da década de 1960, ordenada pelo então presidente Jânio Quadros. Realmente, um deleite para todo criativo fascinado pela história. A verdade é que a ucronia parece não ter limites, embora poucos a conheçam de nove. O subgênero flerta com as leis da ficção científica, mas também toma para si muitas propostas do terror; até porque reimaginar nossa história pode soar bastante aterrorizante, não?



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