Um dos jogos mais aclamados e, ao mesmo tempo, criticados, a sequência de The Last of Us trouxe uma história sobre vingança e diferentes pontos de vista em um mundo destruído por um vírus mortal.
O jogo começa com um conflito entre Joel e Ellie por Joel não ter dito a verdade sobre o que ocorreu no hospital no final do primeiro jogo. Ellie sente raiva, rancor e mágoa em relação a Joel; ela se sente enganada e impotente por não ter tido a opção de escolha sobre sua vida. Por outro lado, Joel entende o que ela sente mas ao mesmo tempo não se arrepende de nada.
Joel não é um herói, nem altruísta. Ele é humano e ama Ellie como uma filha. Ele já perdeu uma filha, e perder outra seria como perder seu mundo. Se o mundo tirou algo dele, ele está disposto a tirar algo do mundo para salvar quem é importante para ele. Joel salva Ellie e mata os médicos na sala de cirurgia — uma sala que poderia simbolizar a esperança da humanidade, já que Ellie é imune ao vírus, e os médicos pretendiam criar uma cura.
Joel morreu em consequência de suas ações, sendo morto por Abby, filha de um dos médicos que ele assassinou. Mas, em seus últimos momentos, tudo que Joel Miller podia fazer era olhar para Ellie, preocupado com o bem-estar dela. Mesmo com sua vida se esvaindo, tudo que importava para ele era sua filha, tudo que importava era seu mundo.

Assim se inicia a jornada do segundo jogo, uma jornada de vingança. Ellie quer matar Abby, quer vingar a figura paterna que perdeu, e está disposta a fazer o que for necessário para conseguir isso.
Em sua trajetória, Ellie mata diversas pessoas — pessoas com famílias, amigos, amantes, assim como ela mesma. É quase como se estivéssemos lutando contra reflexos de Ellie. A matança lhe traz raiva, dor e ódio a si mesma; ela já não consegue mais se olhar no espelho, focada apenas em sua vingança a corrompe, ela magoa sua amada e se destroi nesse caminho.
No final, Ellie não consegue matar Abby. Atrás de si, um caminho repleto de corpos e vidas interrompidas. Ellie perdeu dois dedos e já não pode mais tocar violão — o instrumento que Joel lhe ensinou a tocar ,instrumento que quando tocado trazia lembranças de seu pai, daquele que nunca foi embora, daquele que ela tratou mal no fim da vida dele, que ela não pôde dizer uma última palavra gentil.
O arrependimento a corroi, destroi sua alma e faz lembrar que mesmo que matasse Abby, ela não traria Joel de volta, não traria sua alegria de volta e também entende o lado da Abby, pois essa apenas matou Joel porque ele matou o pai dela na sala de cirurgia. Ellie encerra o ciclo de ódio, ou ao menos tenta, não por ser boa ou altruísta, ela é humana igual Joel, mas ela encerra por sua dor ser maior que seu ódio, por sua dor a fazer entender alguém que ela odeia.
No fim, fica um gosto amargo na boca de quem joga. Há uma sensação de desconforto, pois todas aquelas horas de gameplay e toda a luta de Ellie parecem ter sido em vão. Todo o caminho percorrido parece não ter levado a nada. Talvez tenha sido assim, mas a tragédia faz parte desse mundo. Na verdade, ela é a base desde o primeiro jogo. Não é necessário que uma história leve a um desfecho confortável, que faça o espectador sentir-se bem consigo mesmo ou completo. Ele pode sim se sentir desconfortável e até questionar o porquê de tudo isso.
The Last of Us Parte II, utiliza sua narrativa para transmitir uma metalinguagem; o mesmo sentimento de Ellie é passado para nós, uma confusão de ideias e sentimentos que trazem as lembranças dóceis de Joel com um tempero amargo trazido pelas palavras rudes, pela forma de lidar com o luto — através de violência e ódio.
É uma história profunda, com personagens humanos, sem heróis ou monstros, muito além dos infectados daquele mundo. Vai além do físico, tocando o mental e o emocional, principalmente o coração de Ellie, que, no fim, ao tentar tocar violão e falhar, demonstra as consequências das sementes que plantou com raiva e tristeza. A tragédia de Ellie é um dos ápices narrativos que um videogame conseguiu alcançar nos últimos anos.
Excelente trabalho! A narrativa da parte II é poderosa, né? Ao mesmo tempo que a vingança faz Ellie perder tudo, é a vingança que faz ela salvar a Abby. Que doidera. Quando ela se lembra do Joel, uma imagem positiva, e isso a impede de matar Abby, acredito que foi uma forma de manter a memória boa dele em si mesma e não cometer os mesmos erros que ele, repetindo um ciclo sem fim. Como punição pelo rastro de sangue que ela deixou, fica a solidão, seu maior medo, e a incapacidade de tocar violão e se aproximar de Joel outra vez. Mas acredito que, de certa forma, naquele momento, Ellie deu um ponto final à toda dor que a…