Em uma aula na universidade, buscando estudar justamente o que são "Imagens Interativas", percebi que nessa interseção que chamo de Arte/Literatura, emerge uma complexa rede de significados, onde a narrativa se desdobra não apenas nas palavras de um livro, mas também nas construção de toda imagem. Imagens de dentro e de fora dos museus; aquelas que nos acompanham diariamente, ou que, tão de repente, nos aparecem. Essa junção, que a cada dia me faz mais sentido, parece ser sempre um convite para o papel do olhar, da emoção e da linguagem na apreciação da expressão artística.
Logo quando falamos do "olhar", surge uma analogia primordial entre o olho como "janela da alma" e a arte como "janela do mundo". Esse, claro, pode ser um ponto de partida intrigante. Contudo, surge a questão: com que olho observamos essa janela artística? A Arte/Literatura propõe que muitos olhos verão por através dessa janela, e que por mais que alguns olhares possam se repetir, a experiência nunca poderá ser a mesma. Essas são conceituações da Cultura Visual, mas eu busco ir além: se o olho é a porta de entrada para a alma, a arte é a porta para um universo simbólico, no qual a linguagem das palavras e das imagens se entrelaçam.
No final, estamos falando de narrativas. Únicas e poderosas.
"Se Romeu tivesse os olhos de um falcão, ele não se apaixonaria por Julieta", José Saramago no documentário Janela da Alma, ano 2001, direção de João Jardim e Walter Carvalho
Ao perceber que a magia de ler um livro está na história que não é contada, mas naquela que criamos, imaginamos e lemos nas entrelinhas, percebe-se essa capacidade única do sensível de instigar a imaginação. Falando de pesquisa, das humanidades em uma projeção global (leia aqui o texto da semana passada "O que são as humanidades e por que elas são importantes, segundo a Universidade do Kansas?"), por que estudar o lúdico e o sensível?
Estudar o lúdico e o sensível nas humanidades é o mesmo que alcançar as camadas mais profundas da experiência humana. Quando nos voltamos para a interseção entre Arte e Literatura, encontramos uma riqueza de elementos que vão além da mera observação estética.
O lúdico, muitas vezes associado ao jogo e à ludicidade, encontra sua expressão na capacidade de enxergar o mundo através de uma perspectiva mais leve, imaginativa e criativa. Na literatura, por exemplo, essa dimensão lúdica se manifesta nas entrelinhas, nas metáforas que convidam o leitor a participar ativamente da construção da narrativa. O jogo de palavras e imagens não apenas entretém, mas desafia a mente a explorar novas possibilidades, a questionar e a interpretar.
O sensível, por sua vez, está intrinsecamente ligado à emoção e à capacidade de perceber a beleza e o significado nas sutilezas do mundo ao nosso redor. A arte, seja visual ou literária, é um canal por meio do qual essas emoções são transmitidas e recebidas. A leitura de um poema, por exemplo, pode despertar sentimentos profundos, assim como a contemplação de uma obra de arte visual pode evocar uma gama variada de emoções.
Ao estudar o lúdico e o sensível, estamos, na verdade, investigando as raízes do humano, explorando a maneira como as expressões artísticas moldam e refletem a complexidade de nossa existência.
A narrativa da imagem, inserida nesse contexto de estudo das "Imagens Interativas", surge como um conceito capaz de agir através de uma história visual, muitas vezes simultânea e interligada à narrativa textual.
Em uma obra de arte, seja essa visual ou não, se tem a imagem. Não é preciso enxergar para ver.
Assista o Documentário: Janela da Alma, ano 2001, direção de João Jardim e Walter Carvalho
As narrativa pode ser criadas através dos detalhes: expressões faciais, gestos, cenários, símbolos, sons e cheiros. Da mesma forma, como um mesmo fenômeno, a imagem pode ser construída. Ao explorar a narrativa da imagem, é fundamental reconhecer que as imagens têm o poder de evocar emoções, estimular a imaginação e comunicar ideias complexas de uma maneira que vai além das limitações da linguagem verbal, mas também carregam a capacidade única de reverberar aquilo que há no nosso imaginário; completamente pessoal. Cada elemento visual, desde a composição até as cores escolhidas, pode contribuir para a construção de uma história única e poderosa.
Ainda assim, A magia da narrativa da imagem reside na sua capacidade de oferecer múltiplas camadas de interpretação. Cada observador traz consigo suas experiências, emoções e bagagem cultural, o que resulta em uma diversidade de significados atribuídos à mesma imagem.
Comments