top of page
  • Instagram

As heranças mitológicas e fantásticas de Dark Souls








ree


A série de jogos Dark Souls, responsável por iniciar um gênero de jogos chamado “Soulslike” é ambientada em um mundo de fantasia medieval ricamente construído, trazendo em sua mitologia e worldbuilding diversas ideias novas e cativantes.

           

O mundo imaginado por Hidetaka Miazaki é marcado pela mudança e por ciclos. O jogo abre com um poema, narrando sua gênese ou início:

 

“Na Era dos Antigos, o mundo era sem-forma e coberto por névoa.

Uma terra de penhascos cinzentos, Grandes Árvores e Dragões Imortais.

Mas então veio o fogo, e com o fogo a diferença.

Calor e frio, vida e morte, e claro, luz e escuridão.

E da escuridão eles vieram e encontraram as Almas dos Senhores no interior da chama.”

           

O cenário descrito é o de um mundo indiferenciado, governado por dragões imortais, mais semelhantes a estátuas do que seres vivos, situação que muda apenas com a chegada do fogo e das “Almas dos Senhores”.

 

Eis que surgem as figuras mais importantes da narrativa que representam o início do panteão de deuses desse universo: Gwyn, o senhor do sol e divindade mais importante do panteão; Nito, o senhor dos mortos; a Bruxa de Izalith, que domina a magia de fogo; e o Pigmeu Furtivo, o ancestral de toda a humanidade.

 

Porém, o ponto em que a história do jogo efetivamente se inicia é num futuro distante do narrado no poema, o fogo primordial está se apagando e com ele todo o império construído por Gwyn e pelos outros deuses.

 

Uma das consequências do enfraquecimento do fogo é a “maldição da não-morte”, que acomete os seres humanos e faz com que eles sejam incapazes de morrer de maneira definitiva, a cada morte sendo revividos e chegando cada vez mais perto de um estado catatônico chamado “hollowing”, onde o corpo da pessoa se encontra num estado decaído e sua sanidade mental extinguiu-se.

 

O conflito central do jogo se dá no desafio do personagem principal, um humano acometido pela maldição, de ajudar a manter a chama acesa (ou extingui-la, a depender do caminho decidido), enquanto tenta evitar se tornar um “Hollow” – metáfora também para a desistência do próprio jogador.

 

O tema principal que permeia Dark Souls é a dos ciclos. A narrativa gira em torno do fim de um ciclo, a Era do Fogo, e da tentativa incessante dos deuses, principalmente Gwyn, de impedir que tal ciclo se acabe, a chama se extinga e chegue a Era da Escuridão.

 

Essa figura de um deus poderoso obcecado por tentar impedir seu destino fatal espelha a de Odin, na tradição nórdica, que também tenta incessantemente impedir o Ragnarok, entendido nessa tradição não como o fim do mundo, mas sim como o fim da era atual e o começo de uma nova não mais comandada pelos antigos deuses – em Dark Souls, a Era da Escuridão não mais a ser comandada pelos antigos deuses, mas sim pelos humanos.

 

Gwyn também tem claras influências da figura de Zeus, da mitologia grega: “Rei” dos deuses e portador de raios, figura que, embora não tenha criado o mundo, é a responsável por organizá-lo, substituindo um reinado anterior desordenado.

 

A narrativa de criação apresentada também compartilha características comuns a diversas outras. A imagem de um mundo primordial sem forma e de certa forma indiferenciado é cara a muitas tradições históricas do mundo real.

 

O texto babilônico Enuma Elish descreve o estado inicial de coisas destaca o fato de o céu e a terra não serem ainda nomeados e existirem apenas dois seres que se misturavam num só. De forma semelhante na tradição judaico-cristã, a narrativa de criação tem início quando a terra é “sem forma e vazia”, sendo então moldada e organizada por Deus.


Porém, o universo de Dark Souls não deve suas influências apenas às tradições mitológicas do mundo real, ele também contém diversos tropos e temas comuns ao gênero da fantasia.

 

O que o difere de outros mundos de fantasia medieval (os primeiros Final Fantasy, Dungeons & Dragons e Senhor dos Anéis, por exemplo), é o fato de jogarmos não no auge do poder desses reinos, mas sim em seu fim.

 

O mundo está decadente, seres antes divinos agora são apenas cascas do que foram, humanos cada vez mais se tornam “hollows”, sem consciência e propósito, e quase tudo é hostil a existência do jogador. Até mesmo a profecia, apresentada no início do jogo é na realidade uma invenção de Gwyn e dos outros deuses, não uma profecia real.

 

Com essa breve apresentação da narrativa presente no jogo, espero ter apresentado algo de novo aqueles que já conheciam esse mundo e incentivado os que não conheciam a se aprofundar nesse universo, um dos mais fascinantes da fantasia contemporânea, que ainda tem muito a oferecer.

Comentários


bottom of page